As Ruas

Andei pelas ruas, ruas que tornavam a voltar em meus sonhos, em meus pesadelos,


perguntas que um dia se diluíram no absurdo, estrelas que ninguém viu, que nenhum satélite fotografou, que se despedaçam por entre os meus dedos, arranhados pelo nervosismo de um dia que não se cansa de chorar, pelas alamedas cheia de cadáveres, pela poesia que não se percebe, pelo sujo hemisfério que meus olhos arqueados se esforçam para ver, pela indignidade de uma vida que se perde, as ruas dominadas por um estranho aroma de sangue, medoe revolta.



pessoas inauditas se separam, se misturam, nas vielas que criam, elas mesmas,


no arrebol que nasce e não cessa, vielas que tornam-se labirintos, labirintos sem alma, da imensidão azul que se espelha em meus olhos coloridos pela alma, alma em desacordo, em profusão de espelhos, quanto sussurro, quanta fome de enigmas, quantos desejos eu suportaria - um esconderijo contra a morte...



contra a brutalidade dos homens, contra a força intempestiva do acaso, contra a violência do olhar, contra a insensatez de uma vida que se contorce pela dor de uma partida, no arrebol partido que enlaça nossas vidas que se partem, que afrouxa meus ombros de angústia, minha estupidez humana que enverga meus ombros de angústia, minha sanidade de homem que esconde a mais infame das covardias, a mais impotente das covardias, com todo o desprezo e misériaque acompanha a maior das covardias - a poesia entrementes entra pelos meus poros, uiva ensandecida pelas ruas, pelas ruas, pelo asfalto que se quebra, que se parte em muitos, fragmentos de uma hora esquecida, de uma hora consumida pelas ruas, sob os meus pés enlameados, pela lama que preenche meu corpo e o mundo, pelos buracos negros de vidas que se afastam de si mesmas e se encontram do outro lado das ruas, das ruas, ruas que trazem um nome, que partilham um nome, que imersas no horror a nenhum nome se detém, que tem na vida o seu campo de extermínio, que nos enlouquece a ponto de não mais nos lembrarmos quem somos, que penetram minha carne-concreto abatida pelo ruído das ruas, das ruas, as ruas regurgitam um nome.



o asfalto é quente e úmido, crianças sofrem a miséria na carne, as gentes que antes bebiam agora riem, do asfalto brotam rostos inumeráveis, rostos picados pelo ódio, pela indiferença dos homens, rostos humilhados por séculos de exploração e miséria, grito dos excluídos de uma manhã sem rosto, de uma aurora avermelhada e seca que suga nossas veias insensíveis, surto de imagens na pele, no ardor da pele que respira, flores tristes e partidas, que reproduzimos através dos nossos olhos amarelos - ruas de sangue, ruas de pesadelo, de asfalto e ódio.



cores que minha poesia desafia, sem lirismo, sem esperança...



Vladimir Santafé


@VladimirSantafe


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